Bate-papo com prof. Francisco Chagas no YouTube: o vírus da
globalização e a normalidade da crise
Hoje,
sexta-feira, 27 de março, em meio às medidas de isolamento para conter a
disseminação do Covid-19, ocorreu um bate-papo no YouTube conduzido pelo
Professor Francisco Chagas do Nascimento Jr. do Instituto Multidisciplinar da
UFRRJ. A proposta, que se iniciou como uma “aula online”, o surpreendeu, pois
nasceu da inquietude dos estudantes de Geografia da referida universidade
quanto à implicação da globalização no rápido processo de disseminação do vírus
pelo mundo. Graças à articulação e esforços dos estudantes Luana Vieira e
Luciano Paixão, e da Professora Roberta Arruzzo, pudemos ter a honra de
enriquecer e geografar esta manhã de sexta.
A
discussão girou em torno de uma ideia central: no mundo atual, as crises
tornaram-se estruturais e vivemos, na realidade, uma crise estrutural
civilizatória. Nosso modelo de desenvolvimento econômico e social, calcado no
capitalismo globalizado, é também nosso atual período histórico produtor e
fomentador de crises; de tal modo, este período é intrínseco à crise e existem
necessariamente ao mesmo tempo, tornando-se normalidade.
É neste
sentido que Milton Santos (1999) nos ajuda a distinguir as crises do modelo
atual das anteriores, porque “os dados motores e os respectivos suportes, que
constituem fatores de mudança, não se instalam gradativamente como antes, nem
tampouco são o privilégio de alguns continentes e países, como outrora”. Num
mundo dito globalizado, as técnicas contemporâneas permitem que as redes, os
fluxos e as dinâmicas se deem de forma concomitante, com uma frequência e com
uma força nunca vista, ainda que não se manifeste exatamente da mesma maneira
em todos os lugares do globo.
Ao produzir
ordem, mas também desordem, onde a primeira se retroalimenta da segunda, os
fatores hegemônicos subjugam países, pessoas, empresas, instituições, e lugares
à sua lógica de produção – utilizando e sugando diferentemente tais
possibilidades, realizando diferentemente a velocidade do mundo.
É assim que,
numa crise global de saúde, onde o neoliberalismo vem projetando um terreno de
total desconstrução do Estado de bem-estar social, os países periféricos têm
sua população largada à própria sorte. Como se já não bastasse a ausência do
Estado nas periferias urbanas cotidianamente, em tempos de crise pandêmica, o isolamento
para contenção do vírus força os trabalhadores autônomos, de economia popular,
a pararem suas atividades e sua única fonte de amparo. Desse modo, se dinheiro,
alimento e saúde, e muitos outros recursos já eram incertos e escassos, agora a
população é obrigada a conviver com a falta em sua totalidade.
A
crise, sendo intrínseca ao sistema capitalista, gera ainda mais lucro quando
não há crescimento econômico. Com o Estado cada vez menor para a livre atuação
do mercado, a ideologia neoliberal se mostra cada vez mais incapaz de ocupar
seu lugar, pois o foco não é fazer a economia crescer de forma duradoura para
assim distribuir e atender às necessidades do povo, mas sim concentrar e
acumular as riquezas.
Parece óbvio
que o interesse hegemônico seja subordinar e acumular, porém o sistema também
se reproduz instrumentando discursos para um modelo de sociedade servil e
apática. Enquanto se precarizam as condições de vida da população e se
privatizam cada vez mais serviços básicos pelos insistentes discursos de nossos
governantes frente a nenhum crescimento econômico, este mesmo país gera
acumulação para, e somente para, as corporações, sobretudo bancos, em meio à
crise civilizatória.
A crise do
coronavírus não é excepcional, é um vírus que nos atinge em espectro global,
graças à globalização. Com um mundo cada vez mais integrado para as cadeias
produtivas, epidemias deixam de ter meros impactos locais ou regionais para se
tornarem tão globalizadas quanto todos os outros aspectos do mundo
contemporâneo, de rápida difusão e assentada sobretudo nas redes e na
urbanização latente e desigual. A grande questão é que, em função do nosso
ponto de partida, das condições territoriais e do meio, a pandemia se torna
ainda mais temerosa, numa situação injusta e desonesta, onde os trabalhadores e
suas famílias se perguntam, aglomerados em pequenos cômodos, ausentes de
saneamento básico, se aceitarão o risco de serem infectados ou se morrerão de
fome.
27/03/2020
Referência
síntese produzida por Maria Eduarda Bastos
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